Beatriz Nogueira
Natural de Lisboa
Licenciada em Serviço Social
Sou jovem, sou mulher, sou licenciada em Serviço Social e estagiei durante um ano na Casa de Acolhimento para Crianças Refugiadas do Conselho Português para os Refugiados (CPR), onde continuo como voluntária. Partilhei histórias, alegrias, tristezas, conquistas, desgostos, dias, medos e muito mais com jovens, como nós, homens e mulheres, como nós. Agora, partilho um bocadinho do que me vai na alma, com vocês, jovens, como eu e como eles.
Assim muito rápido – em 2017 (ano dos últimos relatórios do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e do CPR), foram feitos 1750 pedidos de proteção internacional, maioritariamente por cidadãos africanos e asiáticos. A maioria dos pedidos foi feito por pessoas dos 19 aos 39 anos. 455 destas pessoas são crianças (menores de 18 anos) e 28 crianças não acompanhadas (menores de 18 anos sem pais ou outra pessoa maior de idade que cuide delas). Em todos estes, foram reconhecidos 119 estatutos de refugiado e 381 títulos de autorização de residência. 455 pedidos foram rejeitados e 476 pedidos ficaram pendentes.
Diariamente, pessoas, homens e mulheres, famílias e crianças vêem-se forçados a deixar as suas casas, as suas famílias e o seu país em busca da sobrevivência e da segurança.
Começo com números porque é importante termos noção da presença desta realidade no nosso país. Pelos vistos, parece que sentimos mais as coisas quando se passam por perto. Mas o mais importante de tudo é percebermos que estas pessoas são tudo menos números. Diariamente, pessoas, homens e mulheres, famílias e crianças vêem-se forçados a deixar as suas casas, as suas famílias e o seu país em busca da sobrevivência e da segurança. Todos os dias pessoas sofrem por causa da guerra, da pobreza ou de outros conflitos políticos ou sociais nos seus países; pessoas ganham coragem para partir e vir à procura de paz; pessoas atravessam países, nas piores condições; pessoas esperam eternamente que fronteiras sejam abertas; pessoas morrem antes de chegar ao seu destino; pessoas são vítimas de detenções, abusos físicos e sexuais, trabalho forçado, escravatura, tráfico, a caminho de uma suposta segurança. No seu país de acolhimento ainda há um caminho a fazer para que possam ser integrados plenamente nas comunidades e tenham acesso aos serviços que lhes garantem a igualdade de oportunidades. O estatuto de refugiado que lhes é atribuído, que legalmente lhes dá acesso a serviços e direitos básicos, persegue-os para toda a vida como um rótulo social.
Todos os dias pessoas sofrem por causa da guerra, da pobreza ou de outros conflitos políticos ou sociais nos seus países; pessoas ganham coragem para partir e vir à procura de paz.
Muitas destas pessoas são crianças e jovens, como eu e tu. Cada um com as suas paixões, os seus sonhos, os seus medos. Sonhos de ser canalizador, cozinheiro, médico, educador de infância, sonhos como ficar a viver em Portugal, viver noutro país, reencontrar a família, constituir a sua própria família; paixões por artes marciais, por futebol, pelo Cristiano Ronaldo, por comida, por rapazes e raparigas, pelo seu país e pelas suas famílias e amigos; medos do escuro, de ter um desgosto de amor, de não conseguir aprender a falar português, de não ter boas notas, de não conseguir fazer amigos, do racismo, da discriminação, de ter de voltar ao seu país ou nunca mais poder voltar. Isto tem a ver connosco. Tem a ver comigo e contigo. Especificamente até porque estão aqui em Portugal, como eu e tu. Porque vivem nas mesmas cidades que nós, andam nas mesmas escolas e nas mesmas universidades que nós. São nossos vizinhos, nossos colegas. Porque são jovens como eu e tu, homens e mulheres como eu e tu. Porque são pessoas, como nós.
Mesmo depois das caminhadas mais duras das suas vidas e apesar de todo o sofrimento que sentem diariamente, cada um dos jovens que conheci sonha alto e luta dia após dia por uma vida digna, não só pela sobrevivência. Estes exemplos de coragem e resiliência merecem, no mínimo, da nossa parte, o espaço, as condições e o apoio para poderem alcançar os seus objetivos. Para além de, claro, a igualdade de oportunidades ser um direito deles e de todos. Vamos lá respeitá-la e lutar por ela, como cidadãos e jovens que também somos.
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